24 de mar. de 2020

O Interrogatório


Lembro de escrever este conto quando minha mãe assistia muitas séries policiais. Sempre me pareceu absurdo que as pessoas se lembrassem exatamente de detalhes depois de dias, meses e até mesmo anos. Eu? Às vezes até mesmo confundo a esquerda com a direita.




O Interrogatório


- Ah? (surpresa)
- Onde você estava na noite de 16 de Janeiro? (intimidante)
- Ah? (confusa)
- 16 de Janeiro? Onde você estava na noite de 16 de Janeiro. Seu álibi... (mais intimidante)
- Álibi? (surpresa e confusa)
- Sim. Pode nos contar o que fez nesta noite? (impaciente e intimidante)
- Mas se eu nem me lembro o que comi ontem! Como vou lembrar o que fiz em Janeiro passado? (pasma, revirando os olhos)
-  Então a senhora não tem um álibi? (animado)
- Devo ter, mas se não lembro o que fiz como vou saber qual meu álibi? (segura e pensativa)
- A senhora costuma passar na Rua X? (voltando ao intimidante)
- Passo sim, de vez em quando... Ou seria na rua Y.... (pensativa)
- E dobra a direita a caminho de casa, certo? (esfregando as mãos)
- Direita? Não é à esquerda? Qual direita o senhor tá falando? (olhando para as próprias mãos interessada)
- existe uma direita, minha senhora. (surpreso)
- Pro senhor, sim, mas pra mim tem duas que sempre confundo as mãos. (Explicando embaraçada, as duas mãos ao alto acenando freneticamente. Jazz hands.)
- Minha senhora, se não puder nos dar um álibi seremos obrigados a detê-la. (decidido, ameaçador e um tanto confuso)
- Pelo que? Falta de memória ou porque confundo as direitas? (batendo o direito, ou foi o esquerdo... e olhando feio)
- existe uma direita, senhora. Pode agora, por favor, nos responder onde estava na noite de 16 de Janeiro? (impaciente)
- Não estava em casa? Eu sempreem casa. Quase nunca saio. (fazendo bico)
- Mas pode jurar que neste dia não saiu? (alisando a testa com a mão)
- Moço, como vou jurar, sendo uma pessoinha bem honesta, se nem me lembro que dia da semana foi e nem do que fiz? (irritada)
- Mas a senhora tem o costume de passar na Rua X e dobrar e direita, não tem? (coçando a cabeça e pensando em mudar de profissão)
- A sua direita ou a minha? (pergunta natural)
- existe uma direita, senhora! (puxando os cabelos)
- Fácil pro senhor dizer isso que sabe qual é a sua. Eu dobro na minha direita, mas ela pode ser a sua esquerda. meu dilema? (explicando gentilmente, as pessoas às vezes demoram a entender)
- Não existe dilema, senhora. Ajuda se eu disser que foi uma terça-feira? (suspirando)
- Ah! Dia de Strogonoff no restaurante por quilo. Devo ter comido strogonoff! (feliz da vida, esperando por congratulações)
- (Murmúrios ininteligíveis)
- Ah? (inocente)
- Senhora, existe alguém com boa memória que possa nos dizer por onde a senhora andava na noite de 16 de Janeiro? (inicio de apoplexia)
- Ah, tem sim, meu irmão. Ele tem ótima memória. O senhor sabe, ele é uma enciclopédia ambulante e... (alegre)
- Poderia então chama-lo na delegacia? (super esperançoso)
- Pra que? (surpresa)
- Para ele nos dizer por onde a senhora andava. (inchando e avermelhando de maneira alarmante)
- E como ele vai saber? Não mora comigo e o vejo nos fins de semana, mas ele sabe exatamente onde é a direita dele, isso sabe. (começando a se distrair, examinando a sala)
- Senhora... (Cansado)
- Ah? (Distraída, examinando os avisos de não fumar)
- A senhora matou alguém nos últimos meses? (entregando os pontos)
- De verdade? Matar matado? Tipo dando tiro, enfiando faca, envenenando, sufocando? Hi Hi Hi (Animadíssima, fazendo os gestos de esfaquear como no clássico de Hitchcock)
- Sim, senhora, assim mesmo... (melancólico, pensando como tivera sorte até o dia de hoje)
- Ah, assim não. gosto de escrever sobre isso, mas não sou capaz de matar uma mosca. Tá, mosca eu mato. E barata também, porque minha mãe morre de medo, sabe e eu... (explicando amigavelmente)
- A senhora pode ir! (interrompendo grosseiramente)
- Posso? (sorridente) E como saio daqui?
- Saia da sala e vire à esquerda. (respondeu, começando a chorar copiosamente)
- Qual esquerda? (pensativa)


Fim

28 de fev. de 2020

Entre o Céu e a Terra



E finalmente ele sai das sombras e ocupa seu lugar na minha prateleira virtual.
Terminei “Entre o Céu e a Terra” no dia 27 de setembro de 2019, mas somente agora ele pode viver em seu lugar de direito. Revisões, no meu caso, são mais do que necessárias. Várias delas.

Eu sou uma escritora apressada. As palavras correm pela minha cabeça mais rápido do que, muitas vezes, consigo registrar, por isso, dependo de meu revisor, e irmão, para me puxar a orelha, pingar is, cruzar ts e me ensinar regras de português que eu amo ignorar.

Pode parecer idiota, que alguém que ame escrever odeie português, mas é assim comigo. Talvez eu seja impaciente demais, não sei. Mas, sou grata que esse pequeno grande gênio, que eu chamo de irmão, possa me dar seu tempo e seu trabalho. De graça. Não... Não totalmente de graça, eu o pago em porpetas.

Segue para os que se interessarem, uma breve descrição desse meu segundo romance.  E o link para que o comprem, é claro.

Beijocas

Andréa C
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“Entre o Céu e a Terra”

Santa Helena é uma pequena cidade, mas um município de bom tamanho. Suas fazendas, sítios, cachoeiras, trilhas, hotéis e pousadas, estão aninhados entre montes e montanhas. O sol ali é mais brilhante, o céu mais claro e o ar mais puro. Como todo recanto do Vale do Paraíba, Santa Helena tem um charme rural que pouco muda com o passar dos anos.

Nada acontece em Santa Helena, essa é a opinião de muitos jovens que lá vivem e sonham com o glamour da cidade grande, mas a verdade é que muito acontece sob as águas paradas de qualquer lago, e é assim também em Santa Helena.

A vida de Diana mudou no dia que pisou na decrépita pousada. Seus planos para o futuro de repente sumiram como fumaça. Seu futuro marido se revelou como o arrogante idiota que sempre foi e ela havia ignorado. Encarar sua antiga vida, de repente, pareceu demais para Diana e, depois de dias andando pelos campos, e fazendo amizade com fantasmas, ela resolveu que era hora de se tornar alguém que pudesse ser feliz com o destino planejado.

Foi assim que, do dia para a noite, Diana se tornou proprietária de uma pousada nos arredores de Santa Helena, mas, o que ela não sabia, é que em suas terras existiam mais mistérios do que imaginava, e logo ela estaria no centro de um drama que havia começado há mais de um século.

A morte de muitos inocentes espera vingança, mas é possível oferecer paz àqueles que se foram de maneira tão violenta? Diana será capaz de descobrir que mistérios se escondem em suas terras? Com quantos paus se faz uma canoa? A gangue gay tem um limite para sua disposição para compras? Por que no Vale do Paraíba se come comida mineira se está localizado em São Paulo?

Responda algumas dessas perguntas lendo: “Entre o Céu e a Terra”



19 de fev. de 2020

Tentativas e muitos erros...


Acho lindo quando assisto filmes sobre escritores/as e esses se sentam em suas mesas de trabalho com copos de vinho, bebericando enquanto enchem páginas de contos maravilhosos.

Eu tentei... juro que tentei, mas depois de um copo eu começo a ver o mundo muito cor de rosa, o que prejudica minhas histórias, que sempre têm toques de suspense. Fico animada por alguns momentos, escrevo parágrafos enquanto rio de minha esperteza. E logo durmo. O que escrevi tão feliz não me faz o menor sentido quando acordo.




Acho o máximo quando vejo fotos de meus escritores/as favoritos e a caixa com folhas lindamente impressas, uma por uma, dia a dia, de seus novos best-sellers. Aquela pilha de folhas soltas me deixa mais excitada que Brad Pitt nos seus melhores anos.

E eu tentei... Impressora ao meu lado, fui empilhando minhas páginas, sorriso no rosto por estar, de algum modo, ligada por um rito aos meus heróis. As folhas voam. Se espalham como se fosse alto outono. A bancada frente à janela que tanto me inspira não é um bom lugar para minhas palavras, parece. Coloco a pilha de bom tamanho longe de mim e, a cada página, tenho que me levantar e entregá-la ao seu lugar. Faz calor. Ligo o ventilador. Não há um lugar seguro para meu manuscrito. Desisto.



Fico animada escutando escritores dizendo como prepararam seus livros, como planejaram seus arcos, nos seus cadernos cheios de anotações sobre seus personagens. Fantástico!

Lá vou eu, me organizar e encher muitos cadernos, certo? Anoto cuidadosamente as características, os arcos, nomes, idades... Estranhamente, quando começo a escrever os personagens me mandam pastar e assumem a direção, ignoram, com um gesto desrespeitoso do dedo médio, a personalidade que lhes dei, e correm pelas páginas fazendo o que bem entendem.



Cada escritor acha seu jeito, seus ritos, não é possível forçar a mão e a mente a seguir um rumo, não quando ambas estão de comum acordo e te levam, mesmo que resista.

Eu gostaria de responder longamente se alguém me perguntasse sobre um arco de um de meus livros, gostaria de dizer que planejei e estudei as repercussões, mas não é assim. Não comigo. Certas coisas pulam para a página sem pedir e eu as respeito e as deixo viver onde merecem. Fora da minha imaginação.

Abraços

Andréa Claudia Migliacci

13 de fev. de 2020

Como Nasce uma Escritora







   Foi em 2001 que coloquei as primeiras palavras em uma página imaginando que se tornassem um livro. Foram palavras cheias de raiva, malicia e vingança. Nunca o terminei.
  Contos e mais contos eu publiquei em meu blog, recebendo elogios e incentivo; mesmo assim, o medo parecia sempre ganhar e me impedia de me arriscar a terminar um de meus livros. Sim, porque, ao longo dos anos, vários foram começados e abandonados, como amantes que perderam o viço. Isso é o que o medo faz com um escritor.
   Mas um dia, você se senta em frente à tela e olha uma página em branco com saudades, e percebe como sua pessoa é incompleta quando não registra todas aquelas histórias que ficam rodando em sua mente.
   Eu não retomei meu primeiro livro ainda. Nem o segundo. Acho que foi o terceiro que me estendeu a mão e me implorou para terminá-lo. Eu o atendi e reli suas 125 páginas com lágrimas nos olhos, surpresa por amar o que lia, feliz de ver que os anos não me haviam enganado. Era bom... muito bom.
As palavras se atropelaram, meus dedos lentos para registrar o que era agora uma enxurrada de ideias. E então, alarmada, vi que, na metade dessa história, eu já havia comido 394 páginas. 394 páginas! Quem compraria um livro de 700 ou 800 páginas de uma nova escritora? Eu compraria, mas não posso julgar todos os leitores por mim mesma.
   Um plano começou a se formar e o coloquei em ação. Quatro romances para abrir meu caminho. Quatro romances com um toque de suspense, algum drama, quem sabe um tiquinho de sangue, para as pessoas me conhecerem, verem meu estilo, se acostumarem com meu nome. E foi o que fiz.
   No fim do outono de 2019 eu comecei o primeiro deles, um romance que já estava vivo em minha cabeça há algum tempo. Problemas familiares fizeram meu tempo frente à tela curto e consegui terminá-lo nos primeiros dias de agosto. Meu irmão e prima o revisaram, dando o apoio de que eu precisava para tirá-lo de meu computador e entregá-lo ao mundo. Em poucos dias ele estava vivo para o leitor na Amazon.
   Não, não foi um estrondoso sucesso, mas eu coloquei a minha cara para bater e até agora não recebi nem mesmo um tapa. Os poucos que leram o amaram, e respirei aliviada.
   O segundo entrou em produção imediatamente e, em 27 de setembro de 2019, eu coloquei o FIM em sua última página. Mais problemas, as pessoas que podem revisá-lo têm suas vidas e ele ainda espera seu momento de brilhar ao sol. Que deverá ser em poucos dias. Aleluia!
   O terceiro já estava me cutucando irritado, queria ganhar vida com urgência e eu o atendi. Comecei quase imediatamente, mas lá vieram as festas de fim de ano, as faxinas que fazemos para receber uma nova era de cara bem lavada, e ele acabou sendo terminado somente no novo ano. Em 06 de janeiro ele descansou com um suspiro, e entrou na fila para a revisão tão necessária.
   E então veio o quarto deles, iniciado logo no dia 07, e que ainda não foi terminado, mas está já no meio do caminho.
   Esse é o plano, e estes são os livros que me propus a escrever antes de voltar ao meu longo, longo romance meio histórico. Mas... Ah... um quinto está me pedindo passagem. Diz que ele precisa ser contado e eu estou propensa a escutá-lo.
   Não sei se serão lidos, ou se serão amados como eu os amo, mas eu agora os ouço melhor, sinto suas vidas como extensão da minha e vou continuar a empilhá-los nas prateleiras virtuais da Amazon até que alguém os escute. Os folheie. Os ame.
   Assim é que nasceram as “Histórias de Santa Helena” e eu espero que um dia você lhes dê uma chance.

Abraços,

Andréa Claudia Migliacci

PS: Depois da Escuridão você pode encontrar aqui!

8 de out. de 2018

Era uma vez... ou A estória do homem, do rato, da raposa e da hiena.




Era uma vez uma comunidade que não era a melhor comunidade, nem a mais prospera, mas era grande e seu povo tranqüilo e decidido a fazer sua prosperidade se igualar ao seu tamanho.


Esta comunidade criava galinhas e durante muito tempo conviveu com os ratos roubando os ovos, mordiscando as galinhas e às vezes até roubando pintinhos. Era o que se esperava, era o normal e o conhecido, mas o tempo foi passando e todos se impacientavam, pois apesar de prosperar não era tão rápido como esperavam.

Para resolver o problema fizeram uma reunião para decidir o que fazer.

“A culpa é dos ratos, se não houvessem ratos haveriam mais galinhas e mais ovos.”

“Pode ser, mas não adianta discutir sobre isso sendo que sempre haverão ratos.”

“Não se contatarmos as raposas e pedirmos que eliminem os ratos. Podemos oferecer dividir o território com elas como fazemos hoje com os ratos e elas cuidarão do problema para nós."

“Mas ratos são pequenos e se nós nos reunirmos e acabarmos com os ratos ladrões, os outros terão medo e se comportarão.”
“Mas as raposas estão há muito tempo nos propondo dividir o território. Nos prometeram cuidar do problema dos ratos e nos ajudar a melhorar de vida.”
“Mas quem alimentará as raposas? Quantas virão?”

“Não importa quantas virão, nós que mandamos no território. É nossa escolha, não é? Elas terão que se comportar como ordenamos.”

“Muito arriscado....”

Foi então chamada uma votação e as raposas ganharam sua chance de dividir o território. Houve festa naquele dia, homens e raposas felizes sonhando com um futuro melhor. No dia seguinte as raposas caçaram alguns ratos, mas logo desistiram. Somos maiores, pensaram, e agora esse é nosso território, deixe que os ratos fiquem com as migalhas que sobrarem.

Os dias passaram e em vez de progredir a comunidade regrediu. As raposas, preguiçosas e finalmente parte do território convidaram toda família para se banhar no lago, comer da comida do homem e dormir ao sol. Os ratos, se aproveitando que as raposas não se importavam de dividir, contanto que fossem superiores aos ratos em status, continuaram roubando ovos, mordiscando as galinhas e roubando pintinhos.

As raposas, não satisfeitas com as refeições dadas pelo homem, começaram a caçar as galinhas e quando indagadas sobre o numero cada vez maior de sumiços elas culparam os ratos.

“Mas vocês não vieram para acabar com os ratos?” Perguntou o homem irritado.

“Ah, não é fácil. O rato é esperto e mesmo nós, imbatíveis e inteligentes raposas, não damos conta de todos eles. Não é nossa culpa. A culpa é do homem que aceitou dividir o território com os ratos primeiro. Se houvessem chamado as raposas desde o inicio já seriam ricos.” Disse a raposa palitando os dentes com um osso de galinha.

E os dias continuaram a passar e o homem a empobrecer, alguns já com os galinheiros vazios, vagavam pelas ruas sem saber o que havia dado errado. As raposas ficaram gordas e confiantes e cada vez que o homem reclamava elas rosnavam e o culpavam pela ruína da comunidade. Os ratos, não tão gordos, mas ainda felizes com sua sorte, esperavam nas sombras o momento de ganhar novamente a confiança do homem.

Com a comunidade quase em ruínas uma reunião foi marcada e os homens se reuniram novamente.

“As raposas mentirosas estão gordas com nossas galinhas, trouxeram toda família e agora nem mais disfarçam que estão mais prosperas que nós. Os ratos continuam se alimentando sem interferência. Não temos mais o que fazer!”

“Temos o elefantes.”

“Você está louco? Elefantes? Quem vai alimentar um animal desse tamanho?”

“Eles não querem que os alimentemos. São animais que prosperaram sozinhos e agora querem nos ajudar para que estas terras continuem férteis.”

“Duvido... Alguma coisa querem.”

“Eles querem que o mundo melhore. Se nossa comunidade continuar a desmoronar a terra em volta também sofrerá. Sabendo disso eles nos ajudarão contanto que não façamos mais acordos com os ratos ou raposas.”

“Não sei... acho suspeito. Não confio em animal que é rico.”

“Eu tenho outra proposta. As hienas me contataram.”

“Hienas? Você ficou louco?”

“Elas são fortes e sanguinárias. Não teriam problema em matar todos os ratos e raposas. Prometem-nos também que cuidarão do território para que nenhum animal mais o invada.”

“Mas hienas não são confiáveis. Elas são más e odeiam todos os outros animais. Quem nos garante que ela matarão somente os mal intencionados?"

“E importa quem morrer contanto que nós vivamos?”

“Sim, importa. Não quero ser responsável pela morte de animais inocentes.”

“Com a comunidade no estado que está eu não me importo que aja derramamento de sangue se nos trouxer prosperidade.”

E assim foi votado e as hienas ganharam entrada no território. Da noite para o dia as ruas ficaram encharcadas de sangue. Raposas e ratos jaziam mortos por todo lado e os homens, horrorizados, se trancaram em casa esperando o pior passar, mas parecia não ter fim. Qualquer animal que se aproximasse da fronteira era caçado e despedaçado, mesmo aqueles que haviam acabado de nascer.

Os homens foram arrancados de suas casas e ordenados a trabalhar. A comunidade tinha que crescer e era obrigação dos homens fazer do território um lugar feliz para as hienas.

A comunidade acabou isolada do resto do mundo, somente as hienas sabiam o que se passava lá fora, ninguém mais sorria, ninguém mais tinha coragem de tentar conseguir ajuda, seja dos elefantes ou até mesmo dos rinocerontes, pois as hienas puniam a todos que não estivessem satisfeitos com a vida que diziam ser perfeita para os homens.

As casas perderam a cor, os homens perderam o viço e com o tempo toda estrada que levava a eles foi tomada pelo mato.  As galinhas já não punham ovos e, portanto as hienas as mataram por não obedecer suas ordens. Tarde demais os homens perceberam que existem animais que gostam de sangue, gostam dos gritos de terror e do medo que escorre pelos poros. Ainda tentaram se proteger, se barricar em suas casas, cada um por si, mas as hienas eram fortes e não restava mais nada para encher as suas barrigas.

Quando o ultimo grito do ultimo homem soou, as hienas riram seu riso insano e partiram a procura de outra comunidade que acreditasse que ódio e sangue eram o caminho para a paz.



25 de set. de 2018

A minha ditadura.




A justificativa de muitas pessoas para apoiarem um retorno à ditadura é que viveram muito bem naqueles tempos. Não sentiram o peso do chicote e da injustiça porque são “boas pessoas com nada a temer”.

Quando criança também não senti, toda minha família não sentiu. Éramos, e somos ainda, pessoas simples, trabalhadores honestos com preocupações mundanas de sobreviver ao dia a dia da melhor maneira possível e no meio tempo nos divertimos uns com os outros em nossa simplicidade.

Na minha adolescência não senti, nem minha família. Continuávamos vivendo simplesmente, fazendo o possível para sobreviver, o que era cada vez mais difícil.

E então meu pai faleceu de maneira súbita, tão jovem que só tive noção de quão jovem ele era quando atingi a idade em que morreu, meros 39 anos.

Em menos de 15 dias me vi adulta. Com 17 anos me vi obrigada a encarar uma vida a qual não estava preparada. Ser responsável por uma família, pagar aluguel, colocar comida na mesa, esta era minha nova realidade.  De caçula da família passei a chefe de família e apesar de ser a morte de meu pai que me levou a minha nova realidade, não foi uma realidade trágica. Difícil? Sim, mas em pouco tempo me fez perceber que eu era mais do que sempre acreditei.

Naqueles tempos cada vez mais difíceis, o final da ditadura, foi onde eu aprendi que minha vida até ali tinha sido resguardada e que tivera muita sorte em viver simplesmente. Conheci pessoas engajadas na política que me mostraram o que havia de errado em um mundo sem liberdade. Eu, inocente, nunca havia percebido, vivia em um mundo protegido por nossa simplicidade.

O mundo mudou e eu aprendi cada vez mais. Tornei-me uma pessoa que fala o que pensa sem medo de represálias, que escreve o que pensa sem medo de represálias, que age como quer sem medo de represálias. Cresci como ser humano, trabalhadora e mulher nesta democracia agora ameaçada.

Sou classe média e me orgulho disso. Quando meu pai faleceu estávamos quebrados, mas meu irmão e eu conseguimos achar nosso lugar no mundo sem ajuda de ninguém. Com nosso esforço e dedicação fizemos, dos escombros em que fomos deixados em 1981, um lar.

E então chegamos ao agora. Século XXI, tecnologia avançada, o mundo encolhido para caber em um monitor de laptop e vejo tudo que passei para chegar aqui ameaçado.

Não consigo entender nenhum dois lados nesta batalha. A esquerda se provou falha, corrupta e mentirosa. Seu discurso velho de ódio à classe média e a favor dos pobres e necessitados, quando eles vivem no luxo que nós da classe média lhes proporcionamos com nossos impostos, é para mim revoltante. Enquanto pregam o ódio àqueles que levam o país nas costas, suas famílias sem educação e cultura, se banham em ouro e riem dos que ainda acreditam neles.

A direita é para mim ainda mais incompreensível, pois eu entendo os que apoiam a esquerda achando que miraculosamente vão trocar de lugar com a classe média sem ter que levantar um dedo para isso. Alias nunca vi alguém da esquerda dizendo que quer trabalhar duro para conseguir melhorar de vida, como eu fiz, só o que vejo é pessoas querendo viver às custas do esforço alheio. Ayn Rand sabia bem do que falava.

Mas voltando à direita...

Vejo amigos queridos apoiando um homem colérico que diz que é a favor da tortura e que a morte de inocentes não é nada se ele atingir seu objetivo. Porque não se engane, é somente o seu objetivo que importa. Um homem que já disse em mais de uma ocasião que fechará o congresso e trará de volta a ditadura, onde pessoas acostumadas a falar o que querem em suas paginas do Facebook serão provavelmente presas e torturadas por terem opinião.

Este homem odeia. E ele odeia tantas coisas que não imagino o que sobraria de seu reinado. O que mais escuto de seus admiradores é que nós, as mulheres que não o suportam, somos esquerdistas e andamos nuas pelas ruas fazendo protestos toscos. Desculpem, não é assim. Mulheres como eu, que lutaram a vida toda para ser aceitas como profissionais, que deram duro por sua família, mas que ainda sempre ganharam menos do que os homens em mesmas posições, sabem que se este homem ganhar voltaremos aos anos 50. Ele nos tirará cada centímetro que ganhamos em nossa luta pela igualdade.

Feminismo não é uma palavra chula. Não nego que acredito que muitas mulheres a usam de forma errada. Feminismo para mim é a luta por ter meus valores, crenças e habilidades reconhecidas pelo que são e não pelo meu gênero.

Seus outros desafetos, homossexuais, negros, índios e afins, sofrerão ainda mais, pois nós mulheres ele simplesmente considera inferiores à sua grande pessoa, mas os outros são uma ameaça a sua mente pequena e “cristã”. 

A ditadura que vivi não me afetou. Vivíamos pequeno demais para incomodarmos quem quer que seja, mas hoje tenho uma voz. Uma voz que gosta de dividir pensamentos como estes e tremo de pensar que alguém me calará. Não quero calar. Não quero ver minha voz, pequena que seja, perder a liberdade de expor opiniões. Não quero que pessoas que amo percam o direito às suas vidas porque são gays. Não quero um homem ditando o que todos devemos fazer sem se importar com nossos desejos.

Quero acredita que as pessoas que o apoiam não fazem idéia do que realmente acontece em uma ditadura. Talvez tenham vivido pequeno como eu ou, se jovens, nunca se deram o trabalho de se informar. Mas, conhecendo a humanidade, talvez estejam agora deixando o mundo ver o quanto odeiam, o quanto são preconceituosos e maldosos, achando que estão salvos, em sua escolha, dos horrores que ele trará.

Ditadura. A palavra basta, ou deveria, para expor o quão errada é.

19 de set. de 2018

O que te incomoda no amor?




Uma das coisas que me espanta nos dias de hoje é como saíram de seus buracos as pessoas preconceituosas e o que as incomoda. Gays, negros, índios, orientais e até mesmo nós, simples mulheres os incomodamos profundamente.
O homossexualismo não é uma novidade. Sempre existiu e somente o que mudou com os milênios, graças a Deus, é que um homossexual pode amar abertamente. E isso parece incomodar certo tipo de pessoas de uma maneira incompreensível.

Amor para mim é amor. Não interessa para mim quem você ame, contanto que o faça e assim possa se sentir mais completo. Homossexualismo não é uma doença como muitos querem fazer acreditar, é algo que nasce com você e o que se torna uma doença é quando é obrigado a negar quem é para agradar uma sociedade que não tem merda nenhuma a ver com sua vida.

Todos fanáticos ofendidos com a opção pessoal de vida dos outros citam a bíblia. Eu acredito em Deus e não na bíblia. Todo livro escrito pela mão de homens devem se tomados com seu grão de sal. Mesmo que acredite que as palavras impressas vieram de Deus é como acreditar na mensagem final da brincadeira “telefone sem fio”, onde alguém passa uma mensagem no ouvido da pessoa ao seu lado em sussurros para ser passada para frente incontáveis vezes até perder todo seu significado original.

Digamos que possamos ignorar estes mal entendidos na mensagem enviada, o que não podemos ignorar são as convicções pessoais do individuo que transmitiu a mensagem. Somos falhos, nós humanos, e uma das falhas e imbuir nossos pensamentos nos pensamentos alheios, é ler a “mensagem” da maneira que nos convém.
Para mim qualquer pessoa que acredite cegamente em outra, que siga seus passos mesmo que falhos, tem um grande problema.

Mas, vamos lá, você é devoto e acredita cegamente na bíblia e portanto condena o homossexualismo. Ok, seu direito como pessoa, mas porque o ódio? Quando você odeia com tal veemência alguém diferente de você esquece tudo aquilo que diz acreditar, pois uma das coisas mais linda que existe na bíblia é “amar seu próximo como a si mesmo”. Não diz que deve amar somente os iguais a você.

Quando escuto pessoas, que conheço, e me decepcionaram profundamente nos últimos tempos, dizendo que não é natural ser homossexual, sei que estas pessoas são falhas em uma parte de sua pessoa que nunca poderá ser recuperada.

Mas vá lá, é seu direito achar isso também. E então vêm as acusações de que homossexuais são promíscuos. Promiscuidade não é uma característica única aos gays, muito pelo contrario, mas talvez eles sejam mais abertos sobre isso, ao contrario de bilhões de heteros que se escondem por trás de fachadas nobres e entre quarto paredes são não só promíscuos como pérfidos.

Em um mundo que parece se esgarçar pelas pontas, se uma pessoa é gay, hetero, negro, índio, oriental ou o que seja, não devia ser uma das preocupações, mas mentes pequenas atraem mentes pequenas e em vez de se lutar por melhor qualidade de vida, mais empregos, menos políticos corruptos, estas pessoas pensam em excluir qualquer um diferente delas, como se o mundo nunca tivesse sido povoado por nada alem de seus iguais.

Isto, meus caros, é a o que chamam ditadura, o que muitos apoiam hoje em dia e que demonstra o que de pior temos na humanidade.

Não escrevo para converter ninguém, mas porque me entristece profundamente ver no que nos tornamos.